27 outubro, 2012

Sopro do dragão


Eu fiz dezoito anos, eu fiz dezoito anos e não escrevi nada. Talvez porque não signifique grande coisa, talvez porque eu não saiba o que, ou como dizer. Eu estou acabando a escola, eu estou acabando a escola e ainda não preparei nenhum dos meus discursos mentais enquanto encaro o espelho e me teleporto pra longe de onde esteja. Eu me apaixonei, eu me apaixonei e não escrevi nenhum poema lindíssimo. Eu cortei o dedo, eu cortei o dedo e pus band-aid. Mas ele me incomodou, o tirei e comecei a escrever isso aqui.

Eu tinha um sonho, um querer inexplicado, uma vontade de seja lá o que for "quero dar aula". Eu perdi, substitui, esqueci, sei lá o que me aconteceu. Eu tive uma educação musical autodidata, por assim dizer, que me criou. Eu fui a um show do que "continuou" dessa minha banda favorita, e chorei, chorei rios. Chorei descontroladamente quando fizeram menção ao meu cantor favorito, e cantaram Pais E Filhos. Chorei como uma criança, chorei como quem perde um ente querido, chorei como se meu coração estourasse. E estourou. E estoura. Estoura toda vez que algo bonito me acontece.
Eu discuti com uma professora e a vi na rua semanas depois. Nos abraçamos. Eu chorei. Eu dei lugar a uma mulher com criança no colo, recebi um sorriso de quem assistia a cena, eu achei bonito. Eu dormi no ônibus, quase perdi o ponto, quando levantei em meio ao susto um velhinho, que estava sentado do meu lado, me desejou bom descanso, meus olhos lacrimejaram. Na aula de filosofia, depois de tanto implicar com o professor e nada mudar, me calei. Me calei e chorei quando um dia ele disse que perdeu o gás, que não tinha mais objetivos, que "tinha" tudo o que queria, porém não era feliz na essência. Eu chorei também quando vi heróis meus chorando, mostrando que os sonhos deles também são frágeis. Que são heróis, porém humanos. Eu chorei quando me contaram seus caminhos percorridos, ou quando contaram o caminho de outros. Um caminho que quero percorrer.
Eu chorei quando, hoje, no fim da aula no pré-vestibular que curso, meu professor de português (o mais mongol, feliz e saltitante lá presente - vale ressaltar) escreveu no quadro uma parte de Metal Contra as Nuvens e deu um discurso de fim de ano. Meio não querendo ser meloso demais, meio já sendo. Eu chorei, chorei e choro invariavelmente.

Decidi fazer psicologia, entender mais o nosso "eu", como ele é formado, como reagimos a várias coisas, como elas nos afetam, influenciam, condicionam. Acho que é isso, fui condicionada a chorar em alguma parte da minha vida. Sem dúvida fui condicionada ao choro, basta qualquer um citar Legião. Sei que sou redundante, sei que sou chata, mas acho que não há palavras que resumem esta coisa monstruosa que surge em mim quando o assunto é esse.
 Li um pouco e ouvi um bocado sobre budismo, matar o ego. Foi bonito e tal, evito o "eu", mas às vezes ele me surge, toma conta. É bom saber que há algo seu, que te descreve, toca. Algo que lhe serve, invariavelmente. Algo construído, em meio a dor, felicidade, vazios e todo o resto.

Tenho dezoito anos e vi tão pouco da vida, me sinto meio mal por escrever assim, como quem sabe dela. Deve ser normal, deve ser saudável até. Adiar este momento de catarse deve ser corrosivo à alma. Porque, olha, tudo muda! Se eu escrevesse esse texto ano passado estaria repleto de uma felicidade amena, calma. Há dois anos talvez transbordasse melancolia e há alguns 3 anos estaria esbanjando sonhos, à mil e um pés daqui. Cheia de planos, vontades, fome de ver. Ver o novo, ver além, ver o azul celeste.
Talvez eu devesse estar cheia de planos e euforia, talvez seja normal essa coisa, por vezes meio esquisita, que sinto. Meio procrastinando, meio sem gás, meio apertada entre prazos. Meio esmagada entre cobranças que, mesmo não as cumprindo, me esmagam. E esmagam mesmo!

"Eu nem sei porque me sinto assim, vem de repente um anjo triste perto de mim", acabou de me dizer Renato Russo. Talvez seja medo, ou um choque de realidade que começa a me fazer efeito. Mas quem vê assim me acha por demais triste. Não se preocupem, se alguém chegar a me ler. Ando bem, ainda usando o exagero poético que não largo nem por nada dessa vida.
Talvez me falte tirar mais o band-aid. Escrever é mesmo isso, sangrar abundantemente, chorar sem pudor, Aliás, ser Caroline é isso. Não sei se disse a vocês, mas também não gosto de fazer aniversário. É toda uma pressão urbanóide que me enlouquece. Não, por favor, não me cobrem felicidade no meu aniversário, só me deixem ser eu. Nem sou tão triste assim, talvez seja exagerada. É, exagerada eu sou!
Não sei o que escrevo aqui, mas sei que ajuda. Quando for psicóloga vou sugerir aos meus pacientes a escreverem o que sentem, mesmo de maneira mais "grossa", sem "técnica", que seja. A experiência em achar as palavras certas pro que sentem vem com o tempo. Mas que ajuda, ajuda! Mesmo que eu chegue ao fim desse texto me culpando por ter conjugado tanta coisa em primeira pessoa, dito tanto de mim.

Eu queria agradecer quando comecei. Queria dar foco, a esse professor, a citação. Agradecer pelas lágrimas que me arrancou, mas adivinhem quem se perdeu no meio do caminho novamente?!
Por semi-começar tantas coisas e terminar tão poucas, me sinto culpada. Acontece, é o que dizem. Comigo acontece sempre. Não sei se me desinteresso, se perco o ânimo, se não sou capaz de realizar o que almejo. Sei que fica muita coisa incompleta, inacabada. Tenho mania disso, de por um fim lindamente pontuado em tudo. Coisas em aberto nunca me chamaram muita atenção, sempre me causaram muita dor de cabeça. As pessoas esquecem, não sentem culpa ou remorso e, enquanto isso, eu remoo dolorosamente cada mínima lembrança dentro de mim. No final vira tudo culpa, arrependimento. Procuro não pensar muito, pra ver se a culpa não vem, mas no fundo fica aquele sentimento inconveniente mostrando que não foi resolvido. A verdade é que eu idealizo muito, desde pequena ensaio mil e um discursos em frente ao espelho e, pelos meus cálculos, creio não ter feito nenhum deles com êxito. Os poucos que tentei saíram gaguejados, pausados, atropelados, com faltas. DESASTROSO define.
Nem escrevendo me sinto bem representada, há sempre uma lacuna. Sou ruim de memória às vezes, isso deve atrapalhar. Nunca lembro dos motivos pelo qual possam ter me magoado, numa discussão se optarem por bancarem o inocente, ganham! Sou péssima em guardar a culpa dos outros, porém a minha, ainda que não seja uma culpa, ou que não seja minha, não perco, não esqueço ou apago por nada .Queria poder dizer tudo isso em um poema, em um texto, mas não aconteceu. Me sinto meio muito patética com discursos tão abertos. Digo, apoio essa política de discurso aberto. Tudo tão mais fácil de compreender se cada um disser o que lhe agrada e o que causa o contrário. Dizer do que gostam, dizer o que sentem. Mas acho que acaba por faltar um mistério. Na realidade é tudo bem complicado, exemplo: na sociedade comunista nos faz falta uma sociedade em que possamos crescer, nos diferenciar em alguns aspectos. Há a necessidade, quase/ou biológica, de uma meritocracia. Já no capitalismo de tanto crescermos, acabamos por demais nos desigualarmos dos outros. Uso destes exemplos porque ainda não me conformo com o mundo sem uma organização que dê certo. Talvez argumentem, os anarquistas, que é a necessidade de organizar que ferra tudo. Não sei, acho que não também.

A capacidade de ser reinventar espero que exista mesmo. Acho que precisarei dela com fervor de ontem em diante, sim, de ontem mesmo. Mas que meus olhos não mudem, espero também. Quero continuar a ver
tudo com a capacidade de me emocionar que tenho hoje. Não sei se devo pedir pra que ela aumente, sou (no geral) bem chorona, bem bobinha, bem tolinha. Sou mesmo, e me orgulho. Acho que falta um pouco disso em todos, essa coisa tola de gente sonhadora. Olhe só, se tem faltado até e mim, imagina em quem não tem o hábito? Deus, se você existir mesmo, dê mais amor a essa gente. Permita a elas mais sorrisos, abraços mais gostosos e gargalhadas intermináveis. Que amem não só com o coração, com a mente ou o corpo. Mas que amem com os olhos, e a todos. Que amem as tardes virando noite de azul  celeste para azul marinho, enquanto as luzes se acendem.Que amem o despertar e os sorrisos que recebem. Que amem e sustentem e fabriquem e não deixem os sonhos morrerem, os brilhos dos olhos se apagarem sob hipótese alguma.

Tenho dezoito anos e meus problemas se resumem em passar no vestibular e entregar meu trabalhos escolares atrasados antes que a paciência dos meus professores se esgote. Tenho dezoito anos e crises existenciais de hora em hora. Tenho dezoito anos e uma fome de leão no exato momento. Tenho dezoito anos e não cresço mais, não tenho mais a desculpa da fase de crescimento. Tenho dezoito anos e isso não faz nenhuma diferença. Tenho dezoito anos e vi pouco da vida, mas necessito prometer a mim mesma que quanto mais ver, e espero ver com todo esse amor do qual falo, mais escreverei. Mesmo em catarses gigantes e pessoais. Mesmo que não em versos se assim for.


E que não fique suspenso o texto declamado que me levou a escrever isso aqui:

E nossa história não estará pelo avesso
Assim, sem final feliz.
Teremos coisas bonitas pra contar.
E até lá, vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos.
O mundo começa agora
Apenas começamos.





2 comentários:

Anônimo disse...

"meu professor de português (o mais mongol, feliz e saltitante lá presente - vale ressaltar)"
Também adorei te ter como aluna, Carol!

Impermanente disse...

"Talvez me falte tirar mais o band-aid. Escrever é mesmo isso, sangrar abundantemente, chorar sem pudor"
Não sei aonde foi que se viu simplesmente com 18 anos. Acho que tudo que você escreveu é 18 anos. Inclusive começou dizendo que não escreveu nada, pois o fez. Só não está enxergando que os sonhos, as ambições, as alegrias, as ilusões, as paixões pela vida, as lágrimas, os bandaids SÃO os seus 18 anos. Texto lindo. Não é pretensão escrever essas coisas como se tivesse vivido muito, é dar ao mundo o presente de ler coisas bonitas, é se dar esse presente, de 18 anos!